“O Ministério Público de São Paulo (MP-SP) ingressou com pedido para que o Tribunal de Justiça do Estado (TJ-SP) julgue, em caráter repetitivo, a forma como devem ser tratadas as chamadas áreas contaminadas. Para o órgão, esses terrenos, antes de destinados a novas construções, deveriam passar por um procedimento de reparação integral.
Essa é uma questão de forte impacto econômico. Especialmente para as empresas da construção civil que adquiriram essas áreas. Como atuais proprietárias, são responsáveis pela reparação ambiental.
A descontaminação dos terrenos já é considerada cara pelo setor: a um grande empreendimento, por exemplo, pode chegar a dezenas de milhões de reais. E, caso seja aceito o pedido de julgamento em repetitivo e a decisão favoreça o MP-SP, haverá certamente aumento nos custos.
Isso porque o Ministério Público pretende que se chegue a índice de descontaminação total do solo. Caso fique provado que não é possível, seria exigida do proprietário a reparação dos danos causados ao meio ambiente: seja por meio de compensação (em caso de água subterrânea, por exemplo, ele teria de arcar com o tratamento de água em um outro local) ou ainda com o pagamento de indenização.
Haveria, dessa forma, uma mudança de como o procedimento é feito hoje. A legislação vigente estabelece, para esses casos, a remediação para “uso declarado” – ou seja, o necessário para devolver as condições de uso da área (seja para moradia ou para outros fins).
“Existem parâmetros que devem ser seguidos e o plano tem de ser aprovado pela Cetesb [Companhia Ambiental do Estado de São Paulo]. A partir desse plano, a empresa tem condições de avaliar o tempo e o dinheiro que será gasto com a descontaminação da área”, diz o advogado Rodrigo Bicalho, sócio do escritório Bicalho e Mollica Advogados.
Sem esses parâmetros bem definidos, afirma o advogado, as empresas ficariam “no escuro”. “A maioria das descontaminações de áreas na cidade de São Paulo é feita pelo mercado imobiliário. E, por causa da insegurança jurídica e econômica, essas empresas estão agora num enorme sobreaviso em comprar ou não esses terrenos”, acrescenta Bicalho.
Se o pedido de julgamento em repetitivo for aceito, a decisão dos desembargadores valerá para todos os processos sobre o tema que estão em andamento na Justiça de São Paulo. Atualmente, segundo o Ministério Público, são cerca de 40 casos – e existem ainda outros mais de 180 inquéritos civis abertos, que podem vir a se tornar ações judiciais.
Advogados que atuam na área afirmam que o MP-SP iniciou um movimento, a partir de 2013, em busca da celebração de Termos de Ajustamento de Conduta (TAC) com as incorporadoras – para que se comprometessem com o modelo de reparação integral. O principal argumento era que a Constituição Federal exige que seja desta forma.
A maioria das ações que tramita hoje na Justiça, segundo especialistas , refere-se aos acordos não celebrados. Há decisões divergentes na primeira instância do Judiciário paulista e até agora um único caso foi julgado pela segunda instância. Envolve uma ação civil pública contra uma incorporadora que havia adquirido uma área onde antes funcionava um posto de combustíveis. O entendimento do tribunal de São Paulo favoreceu a companhia.
Desembargador da 1ª Câmara Reservada ao Direito Ambiental do TJ-SP e relator do caso, Ruy Cavalheiro reconhece, no acórdão, que o artigo 225 da Constituição Federal prevê o direito ao ambiente ecologicamente equilibrado. Enfatiza, entretanto, que “não se mostra razoável exigir a adoção de solução técnica distinta daquela imposta pelo órgão ambiental”.
Em São Paulo, a Lei Estadual nº 13.577, de 2009, regulamentada pelo Decreto nº 59.263, de 2013, dispõe sobre as diretrizes e os procedimentos para a proteção do solo e o gerenciamento de áreas contaminadas – e a reparação integral não é exigida.
O promotor Marcos Stefani, da 1ª Promotoria de Justiça de Meio Ambiente da Capital, que assina o pedido de julgamento em repetitivo ao tribunal, afirma que o Ministério Público “não quer ser o dono da verdade no trato dessas questões”. Ele diz que os julgamentos em repetitivo, pela segunda instância, permitem uma discussão ampla dos casos – com a participação tanto dos empresários, como, por exemplo, da comunidade científica e órgãos técnicos.
Stefani entende o quadro como “complexo” e ao mesmo tempo “preocupante”. Especialmente com relação à contaminação de águas subterrâneas. “Porque há um grande deslocamento rumo a outros cursos de água e outras regiões. É um problema de difícil solução”, diz.
Um outro ponto levantado pelo promotor é que haveria muitas áreas contaminadas ainda não identificadas pelas fiscalização. “Estamos em busca de segurança jurídica para saber o que fazer com os nossos inquéritos, com outras áreas contaminadas e se as medidas adotadas pela Cetesb seriam suficientes ou não”, completa Stefani.”
FONTE: Valor Econômico
NOTICIA DE 11/JUL/17
Postado em: 12, jul, 2017